trilogia suja das BR´s - episódio 1
Houve uma época em que viajar de ônibus era praticamente um hábito. Uma época remota e bela em que o Bunda e sua turma (sim, ele tem amigos) tiravam férias intermináveis da faculdade e partiam para as plagas ensolaradas da Bahia.
A vida no verão se limitava a arrastar o pé até as oito da manhã, acordar, fumar uma viga, pegar o sol saudável das quatro da tarde, fumar outra viga, bater um gigante PF de moqueca de arraia no restaurante do Badaró, fumar ainda outra viga, tirar um bode e, novamente, cair na dança.
Papai ainda não afogara em dívidas e nenhuma outra responsabilidade que não encoxar o máximo de hipongas Zona Oeste no forró atormentava nossas inconseqüentes e acomodadas cabecinhas ocas.
Sim, o sul da Bahia era mesmo o paraíso terrestre, o país de Cocanha. Mas dura era a viagem até lá...
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EPISÓDIO 1 - o nauseabundo fedelho viciado em "iogute"
Ao todo, eram 7 passagens. Sorteamos os lugares. Ninguém queria sentar ao lado do banheiro, na única poltrona isolada das demais. O motivo: as janelas dos ônibus executivos (naquele tempo ainda não tínhamos "a manha" do convencional) são parafusadas por causa do ar condicionado. É alguém entrar ali, sentar lenha e as férias acabam mais cedo.
Adivinhem pra quem sobrou a ingrata incumbência de encarar 26 horas de busão, na linha de fogo e ao lado de um estranho. Sim, evidentemente, sobrou pra este Bunda aqui.
A princípio, achei que tinha tirado a sorte grande. O passageiro da poltrona ao meu lado não aparecia. Contei vantagem pra toda turma: seria o único a dormir direito, esparramado em dois assentos. O motorista deu a partida. Ria à toa dos reviravoltas do acaso. Resolvi que nem Dramim seria necessário para apagar. Até que chegou a minha vizinha de viagem carregando seu lindo filhinho.
Não tivesse a criança de colo 106 meses de idade, isto é, oito anos e meio, a viagem até que teria tido melhores chances de se provar tranqüila. Mas, não. A turma do Bunda havia virado o jogo. Agora, eu era o alvo do escárnio, prestes a passar um dia inteiro respirando vapor de cocô, confinado numa área de 40 cm quadrados, o equivalente a meia poltrona.
Oito horas de estrada e tudo corria razoavelmente bem. A Fátima era simpática e o Vitão até que falava pouco. A única coisa que me intrigava era o seu devastador apetite, muito afeito a um líquido rosa e viscoso que chamava carinhosamente de "iogute". A cada parada, ingeria meio litro daquilo, mais um saco de biscoito ou salgadinho - daqueles petiscos populares, que têm sabor de camarão e vêm em sacos gigantes.
De resto, o moleque estava de parabéns. Muito educado, sempre oferecia um pedaço das suas guloseimas ou um gole do estranho elixir. A mãe achava o máximo. E lá íamos nós...
Pensando bem, o Vitão tinha outro hábito que também me preocupava um pouco. Gostava de viajar brincando de franco atirador. Sniper profissional com sanha de sangue. Os passageiros já haviam todos morrido pelo menos quatro vezes. Entre um projétil e outro, o Vitão se abaixava de repente para recarregar o seu rifle imaginário e decidir qual seria a sua próxima vítima. A graça do passatempo não acabava.
Lá pela décima quarta hora, ficou patente que a matança havia irremediavelmente fermentado o "iogute". Não só o Vitão havia parado quieto como também mudara de cor. Estava branco, tendendo pro verde.
De repente, tonto de tanta náusea, chamou a mãe. Sequer conseguiu acabar a frase, "num to me sentindo muito..." plaaaaaaaaaaarrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr. O gorfo jorrou de dentro da sua pequena boca sem fundo como água de uma mangueira de bombeiro.
Atento ao desastre iminente, já havia me posicionado longe do alcance do jato que inundou minha poltrona. Meu livro novo do portuga Miguel Esteves Cardoso, O Amor é Fodido, infelizmente não escapou da sopa primordial.
Curioso que a Fátima pediu desculpas e tentou remediar a situação secando o vômito com toalhas de papel e cobrindo a poltrona úmida com uma canga. Ri da cara dela. E passei as restantes dez horas de viagem com a bunda cravada no assento de braço de um das poltronas do corredor.
4 Comments:
O Bunda esqueceu de comentar que nesse mesmo buso, uma mulher de seios kilométricos, pulando pelo soutien, abdome linha do equador e cintura de pilão, entrou no banheiro. 20 minutos depois ela sai, suando como uma porca e com cara de alívio. Eis que um passageiro do ônibus, cabeludo e com cabeça de televisão, entretido em seu discman, solta, sem noção da altura da sua voz: "Meu Deus!!!!!". O busão inteira olha. Uns xingam e outros riem. Crianças choram.
No canto, um turista conclui: nunca andem em um Executivo da São Geraldo.
É verdade. Nem o velho da poltrona 1 conseguiu dormir depois do PT.
Ninguém consegue mais dormir depois do PT...
o cara com cabeça de televisão era o Fil. E o André se fudeu mesmo, mas isso já está virando moda no blog do bunda.
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