29 abril 2009
07 abril 2009
bunda is back!
Passei o almoço de hoje em estado de autismo. Fui convidado pela minha chefe para sentar à mesa junto com funcionários de terceiro e quarto escalões do Ministério vizinho ao nosso e de uma das agências governamentais sediadas no Rio. Predominaram conversas relacionadas a processos burocráticos, ponderações acerca do papel do Estado como fomentador de micro e pequenas empresas e os habituais gracejos sobre a canalhice que corre solta nos Poderes Legislativo e Judiciário. Acompanhei esses tantos assuntos do mesmo bunker de onde degustava, com perplexidade e desconfiança, a comida natural que rendeu ao cardápio do restaurante o direito de ostentar preços, no mínimo, indecentes. Brasília é uma cidade no litoral do lago Paranoá - daí a mania carioca de saúde, magreza e pele cor de cenoura. Restaurantes naturais fazem bastante sucesso nesta praia. Prosperam. Fui incapaz de me engajar na conversação que se desenrolava diante de mim. Já experimentei sensação semelhante no teatro, ao assistir a peças que não me disseram nada ao espírito. Não é por falta de compreensão do que está sendo dito. Tem a ver com uma modalidade de tédio que não é bem tédio, mas completo desinteresse por aquilo que eu poderia dizer caso quisesse dizer algo. Melhor olhar através das palavras, decifrar os pensamentos e as neuroses que os dedos e os ombros das pessoas não sabem camuflar. Escritores são retratados como autistas nos filmes porque escrever exige mesmo um bom bocado de autismo antes da labuta com a caneta e o teclado. Na vida real, porém, compartilhar refeição com alguém assim é disperdiçar uma hora e meia do dia na companhia de um completo babaca. Não se fazem mais literatos como na ficção de antigamente, apenas bundões e prepotentes orgulhosos.
Acordei do transe quando o garçom me abordou com a máquina do Visa e com a informação de que lhe devia 44 reais e 70 centavos, com serviço. Paguei no crédito para não ter que me deparar com trouxinhas de berinjela recheadas de cream cheese (crim xisi) e tomate seco até o mês que vem.
04 abril 2009
a volta do malandro
Nesta vida, o tempo passa rápido. Lá se vão dois anos desde o último textículo. A natureza, no entanto, é estática. Como rezam o ditado e a empolgante canção da ex-banda de Carla Perez: pau que nasce torto, nunca se endireita. Tornei-me servidor público; “alto funcionário” do Governo federal. Tenho um salário e uma rotina em Brasília. Burocrática, sem dúvida, mas enfim posso dar-me o luxo de ir ao supermercado e comprar queijo maasdam e vinho do Porto, dois caprichos que outrora me custavam o dinheiro que não tinha. Meus amigos agradecem imenso - finalmente tenho para custear a cerveja de quinta-feira. Aqueles que se diziam amigos não perdem a oportunidade de cobrar-me antigas dívidas que a verdadeira amizade teria tratado de prescrever. Que seja - quem não teme, não deve. A tão almejada estabilidade financeira, situação gozada apenas pelos definitivamente empregados - carteira assinada e dinheiro aplicado -, chegou. Todos os dias, saio de casa engravatado para o trabalho. Por baixo do terno e do orgulhoso aspecto típico dos recém admitidos diplomatas, misto de executivo prodígio com intelectual humanista, o bom e velho bundão. Como disse, a natureza das coisas e das pessoas não muda. Nem perdoa.
Acabo de regressar do primeiro ensaio daquele que virá a ser o mais irreverente bloco carnavalesco de Brasília. Os chegados da repartição tiveram a espirituosa idéia de lançar uma banda de sambas e marchinhas para tornar a idéia de estar condenado à Capital Federal para o resto da vida profissional menos insuportável. Produzimos um barulho terrível, mas bastante animado para uma tarde de sábado chuvosa. Unidos pela alegria e pela batucada, tomamos muita cerveja e comemos muito fandangos. A diversão pode ser simples como bater papo à varanda da casa, diante da piscina com cascata e do jardim meticulosamente aparado. Começo a entender o prazer de alguns em passar a tarde com os amigos da faculdade, diante da grelha em brasas e imerso no dialético debate sobre a santa trindade - mulheres, futebol e cachaça. Afinal, participar de uma banda de samba me torna mais um partícipe daquele abominável universo mental do playboy da Zona Oeste de São Paulo? A princípio, sim. O Rio de Janeiro, porém, há de redimir-me.