22 dezembro 2005
21 dezembro 2005
18 dezembro 2005
ode à periquita
Foi-se o tempo em que a paixão era uma idéia mal acabada do que é a paixão de fato. Durante a adolescência, a mulher é uma espécie de abstração. A atração física existe, mas vem em segundo plano, descolada da alma. De duas, uma: ou a mina é gostosa ou ela é legal. Aos poucos, entretanto, conforme o interesse pelo futebol cede lugar para a curiosidade de entender a matemática das curvas e a diversidade das fragrâncias femininas, a relação dialética entre corpo e alma se estabelece. Então, as garotas que antes se destacavam das demais por ser bonitas e simpáticas ao mesmo tempo – o que, naquela época, consistia um verdadeiro milagre –, deixam de ser a exceção. Tornam-se a regra. E, conseqüentemente, o paladar do macho começa a se desenvolver.
Um novo mundo se abre para os seus olhos (e para os seus inquietos hormônios). As indiscutivelmente belas continuam unânimes, mas não brilham sozinhas. O macho passa a entender a personalidade da fêmea como um dado da sua sexualidade. Conscientiza-se de que as tímidas, por exemplo, escondem entre as pernas verdadeiros incêndios e de que, por trás de um sorriso duro, que não revela a íntegra da arcada dentária, existe toda uma enciclopédia de perversões e atrocidades.
As chatas são chatas só porque são insatisfeitas; o que significa que a chatice – feliz descoberta – não lhes é natural ou intrínseca, sendo, portanto, passível de ser corrigida (não sem uma boa surra de imoralidade, claro).
As megeras encontram na mesquinhez uma maneira de atrair homens propensos à submissão. Geralmente, têm requintes autoritários: preferem estar sempre “por cima da situação”, gostam de ditar o “ritmo da música” e não têm compaixão pelos “amigos mais íntimos” senão quando a sua “vocação para a liderança” é contestada ou sumariamente arrebatada pela força bruta, pura e simples.
As extrovertidas e também as desinibidas, ao contrário do que a primeira impressão vende, são, de longe, as mais inseguras. Falam de sexo como se falassem de uma ciência trivial: entendem tudo do assunto, já experimentaram todas as posições em todos os lugares imagináveis e divulgam para as amigas menos escoladas na matéria, com a eloqüência de especialistas, que o sabor da “pitanga” é azedinho, mas é sublime. No fundo, a lascívia é inversamente proporcional à criatividade e na hora do vamos ver, perdem completamente o rebolado. Seu maior desafio na vida é vencer as travas da repressão e libertar-se da frigidez. (Sorte delas que há machos dispostos a enfrentar moinhos de vento em nome da felicidade).
Ao longo da vida, o macho também passa a condicionar os seus sentidos para que até mesmo as paisagens mais adversas lhe proporcione deleites estéticos. Assim, surgem as nuances, a riqueza dos detalhes, a originalidade dos traços e a variedade infinita de cores e aromas e formas. O macho entende, enfim, que cada exemplar da fauna feminina é único e constitui individualmente um universo incomensurável e delicioso.
O arquétipo da GORDA, dessa forma, subdivide-se em milhares de variações pitorescas: há as orcas, as morsas, as baleias jubarte, as baleias brancas (que não se enquadram exclusivamente nessa categoria), as elefantas e as jamantas, cada uma com seu encanto particular.
Por sua vez, as fêmeas que padecem do famigerado mau hálito crônico, ou melhor, do bafo de onça incorrigível, são amplamente anistiadas da sua má fama. Sim, porque o bafão é como o vapor de um vinho envelhecido: possui consistência e índole própria, podendo ser encorpado como o interior de uma masmorra ou aguado como urina de criança, silvestre como uma axila ou doce como um fim de feira. Tudo depende da sofisticação olfativa do macho.
Já as mocréias, conhecidas também como buchas ou canhões nas forças armadas, destacam-se pelo exotismo. O macho desenvolve todo um léxico novo em função do olhar apurado. Somente aqueles que padecem de muita pobreza de espírito seguem considerando as frases de pára-choque de caminhão como “mulher feia e macaco gordo só servem pra quebrar galho” engraçadas. O conceito “mulher feia” não faz sentido quando se reconhece na fisionomia dessas fêmeas excêntricas os traços geniais de Picasso, Lucien Freud ou Modigliani. Nariz, boca e olhos fora de esquadro não são características de um rosto desconjuntado, mas belo independente do ponto de vista. A lividez excessiva, combinada a arroxeados indícios de atrofiamento muscular, é graciosa como uma cicatriz no joelho: marca que a vida imprime na pele e que atesta uma infância feliz e agitada. E, por fim, o pescoço de girafa e a macrocefalia o que fazem, senão agigantar a formosura das bruacas?
A vida é uma escola e, em matéria de xavasca, todo o conhecimento do mundo é pouco. A educação dos sentidos leva anos. O treinamento é árduo – às vezes ingrato –, mas ao mesmo tempo arrebatador. É um projeto de vida, um glorioso projeto de vida. Evoé, periquita!
15 dezembro 2005
pedestre
Em alguns bairros da cidade, é possível transitar à pé. Há calçadas. Algumas delas, inclusive, ainda reproduzem o mosaico de mapas do estado de São Paulo em branco e preto. Bairros nobres como os Jardins, Vila Nova Conceição ou Higienópolis e bairros não tão nobres como Moema, Itaim, Perdizes e Vila Madalena.
Neles, a classe média se sente segura. Exércitos particulares guardam os portões dos prédios. Câmeras ocultas, cercas elétricas e holofotes automáticos intimidam os fascínoras. As mães de meia idade (ou domésticas devidamente uniformizadas) podem passear filhos pequenos e poodles em paz enquanto os maridos, trajando agasalhos Nike, exercitam as pernas e se livram do stress praticando cooper.
Infelizmente, não é todo mundo que tem o costume de recolher as fezes dos animais que criam em casa. Catar bosta do chão não pega bem. Algumas pessoas acreditam que o amor, mesmo por um bicho de estimação, não envolve sujeira - vapores e secreções. Ou então não amam. Tanto faz, porque o resumo da ópera é o mesmo: relações conjugais tão assépticas quanto irrelevantes e calçadas minadas de cocô.
Quem anda distraído tem menos sorte. Especialmente em locais onde há canteiros ou gramados. Os proprietários incentivam seus cães a evacuar nessas áreas. Merda não só é biodegradável como fica camuflada onde tem terra. Uma pena para quem caminha com a cabeça nas nuvens.
Sim, porque a classe média nunca escorrega na própria merda...
Quanto será que custa o milagre?
14 dezembro 2005
um pretinho no meio fio
Um pretinho no meio fio é a maneira mais sutil que o demônio encontrou de dar o bote. Tem sempre um que se destaca dos demais. Pela cara de anjo, envelhecida e deformada através do plástico transparente melado de cola. O cigarro ardendo entre os dedos, finos como varas de condão. Tórax magro de tuberculose e afeição mutilada. Magia negra.
Na esquina da São Luís, onde se concentram em bandos, largados ao longo da sarjeta, a noite invade o dia. Vampiros – passam horas e horas vagando a esmo pelos labirintos da própria imaginação, debaixo de cobertores acrílicos antes usados como filtros de ar condicionado nas velhas repartições públicas. Comunicação acontece por telepatia ou gruturais sílabas de um dialeto inventado. Às vezes, interjeições estridentes.
O devaneio do menor conduz todo o bando. O diabo propõe um jogo aos demais com a intenção de levanta-los do chão. O som da cidade é um pano de fundo, longínquo como contemplar o horizonte em oposição ao oceano. 360 graus. Dá até pra adivinhar que a Terra é redonda. Ondas lavam a areia dura. E o vento corre em sentido contrário ao pensamento.
Nesse momento, o marulho é o trânsito acelerando ao sinal verde. O menor dá a largada: ele e seu bando serão gaivotas às avessas – morcegos marinhos.
De repente, estão todos despertos, braços perpendiculares ao corpo e correria. Alguém avistou uma presa do alto do Terraço Itália. Em formação de ataque, descrevem no ar um mergulho veloz, quase suicida, como se o Hilton desativado fosse um precipício. Rasante sobre a calçada no momento exato em que explodiriam contra o concreto. Então, disparam certeiros como projéteis, o sangue rodopiando nas veias do rosto contorcido de êxtase. Espetáculo selvagem. Metálico para os sentidos como um corte. Fotografia em branco e preto. Gravura. Passam por entre os passantes como se fossem invisíveis. Como se o olhar alheio fosse insensível à natureza morta.
Mas a realidade não é bem essa. Pelo menos três pessoas testemunharam o milagre. "A mulher que falava no celular caiu e torceu o tornozelo", disse um. Ao que o outro completou, "e os pivetes sumiram no meio da multidão levando a bolsa dela".
De repente, estão todos despertos, braços perpendiculares ao corpo e correria. Alguém avistou uma presa do alto do Terraço Itália. Em formação de ataque, descrevem no ar um mergulho veloz, quase suicida, como se o Hilton desativado fosse um precipício. Rasante sobre a calçada no momento exato em que explodiriam contra o concreto. Então, disparam certeiros como projéteis, o sangue rodopiando nas veias do rosto contorcido de êxtase. Espetáculo selvagem. Metálico para os sentidos como um corte. Fotografia em branco e preto. Gravura. Passam por entre os passantes como se fossem invisíveis. Como se o olhar alheio fosse insensível à natureza morta.
Mas a realidade não é bem essa. Pelo menos três pessoas testemunharam o milagre. "A mulher que falava no celular caiu e torceu o tornozelo", disse um. Ao que o outro completou, "e os pivetes sumiram no meio da multidão levando a bolsa dela".
13 dezembro 2005
trilogia suja das BR´s - episódio 1
Houve uma época em que viajar de ônibus era praticamente um hábito. Uma época remota e bela em que o Bunda e sua turma (sim, ele tem amigos) tiravam férias intermináveis da faculdade e partiam para as plagas ensolaradas da Bahia.
A vida no verão se limitava a arrastar o pé até as oito da manhã, acordar, fumar uma viga, pegar o sol saudável das quatro da tarde, fumar outra viga, bater um gigante PF de moqueca de arraia no restaurante do Badaró, fumar ainda outra viga, tirar um bode e, novamente, cair na dança.
Papai ainda não afogara em dívidas e nenhuma outra responsabilidade que não encoxar o máximo de hipongas Zona Oeste no forró atormentava nossas inconseqüentes e acomodadas cabecinhas ocas.
Sim, o sul da Bahia era mesmo o paraíso terrestre, o país de Cocanha. Mas dura era a viagem até lá...
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EPISÓDIO 1 - o nauseabundo fedelho viciado em "iogute"
Ao todo, eram 7 passagens. Sorteamos os lugares. Ninguém queria sentar ao lado do banheiro, na única poltrona isolada das demais. O motivo: as janelas dos ônibus executivos (naquele tempo ainda não tínhamos "a manha" do convencional) são parafusadas por causa do ar condicionado. É alguém entrar ali, sentar lenha e as férias acabam mais cedo.
Adivinhem pra quem sobrou a ingrata incumbência de encarar 26 horas de busão, na linha de fogo e ao lado de um estranho. Sim, evidentemente, sobrou pra este Bunda aqui.
A princípio, achei que tinha tirado a sorte grande. O passageiro da poltrona ao meu lado não aparecia. Contei vantagem pra toda turma: seria o único a dormir direito, esparramado em dois assentos. O motorista deu a partida. Ria à toa dos reviravoltas do acaso. Resolvi que nem Dramim seria necessário para apagar. Até que chegou a minha vizinha de viagem carregando seu lindo filhinho.
Não tivesse a criança de colo 106 meses de idade, isto é, oito anos e meio, a viagem até que teria tido melhores chances de se provar tranqüila. Mas, não. A turma do Bunda havia virado o jogo. Agora, eu era o alvo do escárnio, prestes a passar um dia inteiro respirando vapor de cocô, confinado numa área de 40 cm quadrados, o equivalente a meia poltrona.
Oito horas de estrada e tudo corria razoavelmente bem. A Fátima era simpática e o Vitão até que falava pouco. A única coisa que me intrigava era o seu devastador apetite, muito afeito a um líquido rosa e viscoso que chamava carinhosamente de "iogute". A cada parada, ingeria meio litro daquilo, mais um saco de biscoito ou salgadinho - daqueles petiscos populares, que têm sabor de camarão e vêm em sacos gigantes.
De resto, o moleque estava de parabéns. Muito educado, sempre oferecia um pedaço das suas guloseimas ou um gole do estranho elixir. A mãe achava o máximo. E lá íamos nós...
Pensando bem, o Vitão tinha outro hábito que também me preocupava um pouco. Gostava de viajar brincando de franco atirador. Sniper profissional com sanha de sangue. Os passageiros já haviam todos morrido pelo menos quatro vezes. Entre um projétil e outro, o Vitão se abaixava de repente para recarregar o seu rifle imaginário e decidir qual seria a sua próxima vítima. A graça do passatempo não acabava.
Lá pela décima quarta hora, ficou patente que a matança havia irremediavelmente fermentado o "iogute". Não só o Vitão havia parado quieto como também mudara de cor. Estava branco, tendendo pro verde.
De repente, tonto de tanta náusea, chamou a mãe. Sequer conseguiu acabar a frase, "num to me sentindo muito..." plaaaaaaaaaaarrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr. O gorfo jorrou de dentro da sua pequena boca sem fundo como água de uma mangueira de bombeiro.
Atento ao desastre iminente, já havia me posicionado longe do alcance do jato que inundou minha poltrona. Meu livro novo do portuga Miguel Esteves Cardoso, O Amor é Fodido, infelizmente não escapou da sopa primordial.
Curioso que a Fátima pediu desculpas e tentou remediar a situação secando o vômito com toalhas de papel e cobrindo a poltrona úmida com uma canga. Ri da cara dela. E passei as restantes dez horas de viagem com a bunda cravada no assento de braço de um das poltronas do corredor.
12 dezembro 2005
cyber lixo
O Bunda comprou um computador novo semana passada.
O equipamento chegou quarta-feira.
Lindão: muito MHZ, muito MB e muito Giga.
Ontem, pifou.
Hoje, o Bunda lhes escreve do cyber café da esquina, sem inspiração e sem tempo pra se dedicar.
A contra gosto, deixo uma piada...
Lembra daquele quadro do Sílvio Santos em que os casais tinham que adivinhar o que o marido ou a esposa responderia à determinada pergunta? Pois bem...
Silvião (ao marido) - A-ai, e onde foi que vocês fizeram amor na noite de ontem?
Marido - No chão da cozinha.
Silvião (para a esposa, que não ouvia a conversa com o marido) - Perguntei ao vosso esposo onde foi que vocês fizeram amor na noite de ontem. Vamos ver se a resposta confere...
Esposa - Ai, Sílvio, que vergonha. Tenho mesmo que responder?
Silvião - Claro que sim!
Esposa - Ah, tá bom, vai. Ai, que vergonha... Foi no cu.
peniscopia
Laboratório de análise clínica – todo mundo conhece...
Lembre daquela manhã de terça-feira ensolarada, termômetros na rua batendo 32 graus, o suor escorrendo do sovaco que nem vinagre, ardendo em filetes. Lembre daquela noite de insônia recortada por sitcoms da Sony, Sexy Time e um filme de aventura estrelando Charles Bronson; e agora recorde essa madrugada no dia seguinte, pesando nas pálpebras e entorpecendo a cabeça agoniada com o chefe voltando de viagem.
Agora, lembre da fila de espera do laboratório: um milhão e meio de pessoas aglomeradas, mais a rã loira estilo Louis Vuitton ao seu lado coaxando no celular enquanto o vapor grosso do CK One reage com o oxigênio seco e frio do ar condicionado, transformando-se em gás mostarda. Lembre do primogênito do batráquio, uma criança estridente de cinco anos no colo da babá à sua frente, uma autêntica mãe preta como aquelas descritas em Casa Grande & Senzala, fazendo malcriação enquanto se lambuza com um pirulito fosforescente. Lembre do doce caindo no chão rente à sua mochila e um pedido de desculpa que é um meio termo entre silêncio e o descaso.
E, por último, lembre da cara da recepcionista enterrada em pancake, o cabelo embrulhado em laquê, quando enfim o painel eletrônico anuncia o número da sua ficha, 482, e a obviedade delicada da pergunta:
- Bom dia, senhor, em que posso ajudar?
Cabeça gorda, você entrega a receita médica. Ela lê e começa a digitar. Dispara as perguntas: nome, idade, identidade, endereço, se já fez algum exame, se tem seguro, etc, e segue digitando como uma epilepsia. A destreza de taquígrafa da mulher chega a intrigar. Então, quando menos espera, você é arrebatado pelo pior, pelo muito pior que uma picada de agulha...
- Peniscopia, confere?
- O que?
- Peniscopia. O seu médico pediu uma peniscopia.
- Como assim? Não, acho que ele falou outra coisa, era outro exame...
Cabeça gorda, você entrega a receita médica. Ela lê e começa a digitar. Dispara as perguntas: nome, idade, identidade, endereço, se já fez algum exame, se tem seguro, etc, e segue digitando como uma epilepsia. A destreza de taquígrafa da mulher chega a intrigar. Então, quando menos espera, você é arrebatado pelo pior, pelo muito pior que uma picada de agulha...
- Peniscopia, confere?
- O que?
- Peniscopia. O seu médico pediu uma peniscopia.
- Como assim? Não, acho que ele falou outra coisa, era outro exame...
- Não, aqui ó, ela aponta um garrancho com displicência, ele escreveu peniscopia.
- Ahn... e como é que...
- Primeira porta à direita depois do corredor. Ali é a sala de espera número 6. Quando chegar, favor aguardar ser chamado pelo enfermeiro. Obrigada, e estendendo a patinha de unhas violetas, a sua ficha.
- Ahn... e como é que...
- Primeira porta à direita depois do corredor. Ali é a sala de espera número 6. Quando chegar, favor aguardar ser chamado pelo enfermeiro. Obrigada, e estendendo a patinha de unhas violetas, a sua ficha.
Você levanta, desaloja os colhões aparvalhados da calça jeans e parte rumo à tal sala, uma segunda ficha em mãos. Só consegue pensar na expressão simpática do urologista, o Dr. Gustavo, recomendado pelo tio Sérgio, o amigo piadista do seu pai. O camarada Dr. Gustavo Ramos, que não falou nada de peniscopia na consulta de quinta, quando apareceu no consultório dele com uma história mal contada sobre uma suspeita de HPV.
Mal se senta, um enfermeiro franzino te cumprimenta, sorrindo meio irônico, meio com pena, e te guia até a sala de exames.
Peniscopia – alguém faz idéia?
Imagine uma sala branca e, no centro, uma maca hospitalar cercada por instrumentos que mais parecem a maquinaria de uma masmorra medieval. Imagine o enfermeiro, com um sorriso sádico nos lábios, pedindo pra você ficar só de camiseta, se deitar na maca e relaxar com as mãos atrás da cabeça.
Imagine um médico de 98,4 quilos abrindo a porta de repente e caminhando na sua direção enquanto lhe deseja um bom dia. Imagine os dedos roliços do homem e a coordenação de mamute enquanto começa a manipular o seu pintinho apreensivo. Imagine uma vagina radioativa e a graxa ácida que ela libera sendo esfregada na sua glande e dependências enquanto escuta o Maguila discorrer sobre o campeonato brasileiro e empastelar seu membro de gaze.
Agora, visualize um canudo de metal fino de aproximadamente dez centímetros com uma micro-câmera na ponta e imagine que esse brinquedinho, depois de lubrificado, vai ser introduzido na sua uretra com a finalidade de explorar as suas entranhas até mais ou menos a altura do saco, tudo isso ao vivo, na íntegra e em cores no monitor ao seu lado.
Imaginou? Não?
Então deixe-me descrever a sensação: pasta de dente, Gelol, desodorante com álcool, taturana, estilete, Pinho Sol, Tabasco, farpa, mostarda escura, gasolina, Halls preto, gengibre, acetona, corte de papel, brasa de cigarro, limão caipira, craca, navalha, amônia, areia quente, nitrogênio líquido, bisturi, água viva, espinho, ouriço, lixa, merthiolate, carne esfolada, óleo fervente, o pior, o muito pior que uma picada de agulha.
(A moral da história: a traição dói como uma peniscopia)
09 dezembro 2005
faixa 1
Faixa 1 da rodovia Ayrton Senna, km 67, próximo de Guarulhos, 10 de setembro de 2001, 22:42 hs...
Todo mundo já deve ter visto um animal atropelado. Na Raposo Tavares tem direto. Quem mora na Granja sabe. A carcaça fica dias e dias ao relento. Vai inchando aos poucos. Na segunda semana depois do óbito, tem-se a impressão de que não é mais um cachorro que foi atropelado, mas uma capivara. A carne muda de cor. Do vermelho, passa pro roxo, depois pro negro. A morte é contagiante.
Então, quando você já se acostumou a contemplar a mesma velha carcaça podre a caminho de casa, ela de repente desaparece. Arrastada pela chuva, recolhida pelos lixeiros ou desfeita pela decomposição, não sei. O fato é que simplesmente some como se nunca tivesse existido.
Voltando de um feriado em Ubatuba há algum tempo, tive o infortúnio de atropelar um bicho na estrada.
Na verdade, o que aconteceu foi o seguinte: uma outra pessoa havia acertado o animal. O corpo jazia estraçalhado na faixa 1 da Ayrton Senna numa noite de tráfego intenso. Devido à curta distância entre os carros, ninguém conseguia avistá-lo a tempo de desviar.
Cada um que passava contribuía um pouco para rolo-comprimir a carniça. Devo ter sido o décimo quinto automóvel a fazê-lo.
O acidente foi grave. O cara que atropelou o bicho primeiro rachou ele no meio que nem ovo. Vísceras espalhadas num raio de 15 metros pelo menos. Lembro que o pneu reproduziu um fino ruído de atrito ao ingressar nessa área, úmida de sangue fresco.
Conforme avançava, as peças de carne iam aumentando de tamanho e aos poucos revelando a verdadeira identidade daquela carcaça. Linguiça, costelinha, picanha, fraldinha e, então, pasmem: um tórax humano decapitado. E mais a diante, um par de pernas esmigalhadas.
Meus caros, o vômito imediatamente inundou minha goela. Encostei no acostamento pra respirar e desembrulhar o estômago. A no. 1 estva comigo. Ofereceu-se para dirigir. Eu mal conseguia falar.
No dia seguinte, conferi o jornal para saber detlahes do acidente. Nada. Aquela morte passou em branco. Assim como os cachorros da Raposo, que desaparecem sem deixar vestígio.
08 dezembro 2005
hpv - human papiloma virus
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Ao todo, foram três namoradas na presente encarnação. Amei-as intensamente, apesar das muitas (e arrebatadoras) surpresas que me proporcionaram ao longo dos respectivos relacionamentos. Tenho um coração mole, mole, mole...
Uma dessas surpresas foi o Human Papiloma Virus, o famigerado HPV, também conhecido na roça como crista de galo ou verruga de xota.
A namorada mais recente, a de número 3, foi um caso seríssimo na minha vida. Pensei até que fôssemos casar um dia, pra valer: morar numa casinha de vila, comprar um labrador marrom, visitar a família dela em Botucatu nos feriados e envelhecer felizes para sempre. A ela, fui fiel como um cão.
Um belo dia, a no. 3 visitou o ginecologista. Voltou do consultório toda arrebentada porque a médica havia cauterizado três pequenas bolinhas na sua vagina. O material recolhido foi mandado para a biópsia, mas a doutora estava quase certa de que se tratava de HPV.
O HPV, minha gente, é uma porcaria mais fácil de contrair que resfriado em tempo de inversão térmica. É um vírus que vive na pele e nas mucosas genitais tais como a vulva, a vagina, o colo de útero, o pênis e, inclusive, o cu, e, em alguns casos, pode causar câncer.
Não será difícil imaginar minha cara de bunda ao receber a notícia de que havia infectado a pessoa que mais amava no mundo com um vírus letal e sexualmente transmissível. Não existe perdão para crime tão hediondo. Só a pena de morte.
A no. 3 quis encerrar nosso romance no ato, tão grande era a sua decepção. Além de tê-la submetido a mais intensa dor física que jamais havia sentido, também partira o seu devoto coração.
Pedi, implorei, chorei, me arrastei e, por fim, consegui uma pena razoavelmente branda. Fui condenado a um mês de ostracismo sexual e obrigado a submeter meu pirulito a uma PENISCOPIA.
Agora, a questão é a seguinte: como podia ser eu o culpado pelo HPV se até então fora fiel como um cão à no. 3?
Essa história permanece obscura. A única certeza que tenho é que era tão bundão naquela época que sequer contestei minha culpa no cartório. Enfiei o rabo entre as pernas e segui piano até o Fleury, onde um enfermeiro bruto me enfiou uma sonda na uretra.
Foi a primeira vez que tomei no olho do pau.
07 dezembro 2005
lesma com rúcula
Certa tarde de domingo, no famoso restaurante do Itaim, servi uma salada de folhas sortidas para uma jovem senhorita de cabelos dourados. Depois de me alugar por quase 15 minutos com perguntas cretinas a respeito dos molhos das massas e gradações dos pontos da carne, acabou optando por uma "fresh salad, assim, super básica".
Soltou a frase com um imenso sorriso estampado na cara cor de cenoura e se desculpou pela demora. Mas nem mesmo a sua simpatia, contagiante especialmente na altura dos seios rijos como acrílico, foi capaz de refrear a minha cara de bunda. Abandonei a mesa dela ligeiro, de um jeito displicente que considerou "ultra grosseiro". Sem querer, tinha me arrumado mais um desafeto.
Os finais de semana num restaurante como esse em que trabalhei não são brincadeira. A classe média tem mania de impaciência. Porque estão pagando, acham que o mundo tem que funcionar do jeito deles.
Simples assim: os subalternos que se fodam pra resolver viadagens minuciosas como suco de melancia com limão, sem gelo e batido com adoçante em gotas, conter a criançada estragada - verdadeiros terroristas da Al Qaeda - driblando pratos e copos a mil por hora e atender às exigências da vovó Guiomar, alérgica a aspargos frescos e creme de leite.
Que se fodam todos porque o cliente tem sempre razão.
Obviamente, a salada da loira de tetas incríveis levou quase 20 minutos para ficar pronta. Já reclamara três vezes e não parava de me olhar feio toda que vez que passava rente. Quando finalmente chegou o prato, deixei-o na frente dela junto com uma porção de queijo de cabra e outra de pãezinhos frescos. “É por conta da casa e desculpa de novo pela demora”, disse e respirei aliviado. Ela sorriu. Achei sinceramente que meu gesto de bondade havia me redimido.
Não fosse um incidente inesquecível, teria razão. Um grito estridente de repente varou o salão. A loira estava fora de controle. Agitava os braços no ar, vermelha que nem tomate. Exigiu que eu fosse ter com ela imediatamente e me presenteou com o maior espinafre da minha vida. Um espetáculo público dedicado a todos os outros clientes presentes, para que soubessem quem era o filha-da-puta responsável pelo desconcerto do mundo.
O motivo: uma lesma. Sim, havia uma lesma na rúcula da loira. E o culpado era eu. Na cabeça dela, eu tinha colocado o bicho ali de propósito. O gerente foi intimado em seguida. Desculpou-se redobrado e ofereceu-lhe outro prato como cortesia. Mas o barato ali não era o almoço em si, mas a maneira mais escrota de me humilhar. Ouvi quase todos os xingamentos listados no Aurélio.
Apesar de tudo, não levei o desaforo pra casa. A vaca provavelmente nunca tinha visto um escargot na vida, mas devia achar a iguaria deliciosa. Por que? Simplesmente porque se trata de uma lesma francesa.
Em outras palavras, a condição asquerosa da lesma, assim como de qualquer outra coisa, desaparece em função da sua origem. A classe média tem dessas: leva ferro desde que seja ferro importado.
Doce vingança do acaso: a tetuda engasgou num pedaço de lesma e eu fui dispensado mais cedo.
oxiúros
Aprendi sobre eles no cursinho...
Os oxiúros amadurecem no intestino grosso em 2 a 6 semanas. A fêmea movimenta-se até a área perianal, geralmente à noite, para depositar seus ovos no interior das pregas anais do paciente. É o parasita mais comum entre as crianças que vivem em climas temperados. Pelo menos 20% delas o apresentam.
Aprendi sobre eles na vida...
Trabalhei num restaurante muito famoso no Itaim na mesma época em que padecia de um intermitente prurido no esfíncter anal. Um dia, a Bibi, uma garçonete no mínimo desbocada, me flagrou coçando o olho. Apelidou-me de Oxiúro na hora e não hesitou em espalhar a notícia pra todos os companheiros de batente.
O gerente me chamou de lado e pediu encarecidamente que eu não coçasse o cu no salão. Contudo, atender à sua solicitação era inviável. Por dois motivos:
a) eu estava de fato infectado pelo bicho, que é pior que pulga, e
b) o prazer de imaginar a classe média levando à boca um gostinho daquele obscuro orifício que considera tão repugnante era impagável.
Ave, Oxiúros!
06 dezembro 2005
água fria na bunda
O rolo de papel higiênico habita o meu quarto, não o banheiro. Ao contrário da classe média, tenho o costume de limpar o loló utilizando o bidê. Aqui em casa, contudo, tenho de me contentar com o chuveirinho. Não cabe um bidê no banheiro, infelizmente. O apartamento é pequeno.
A classe média tem hábitos podres. Doenças venéreas da alma. Buzinam pra lixeiro e arremessam garrafa na cabeça de travesti sábado à noite. Além disso, gostam de se enganar. Mas o figurino e a pompa não redimem um rabo melado e fumegante.
A verdade é esta: a classe média é afeita ao papel higiênico porque tem nojo do próprio cu. Meter a mão na massa está muito além daquilo que consideram razoável. Sem contar o pudor em relação ao corpo. Seguem achando que cu tem acento.
Quanto ao papel higiênico, é bom que fique no meu quarto. Me resfrio com certa freqüência e costumo socar uma antes de dormir.
A classe média considera a verdade e as necessidades fisiológicas do corpo humano acintes. Merda na cabeça deles e água fria na minha bunda.
05 dezembro 2005
a primeira entrada a gente nunca esquece
Uma época, morei na Rua Antônio Carlos, uma travessa da Augusta, ali perto dos cinemas do Unibanco. Um prédio simpático, apartamentos com varanda, que foi projetado nos idos dos anos 50 para atender a fins escusos. São sete andares do que hoje conhecemos pelo nome de kitchenettes. Naquela época, entretanto, quando o francês ainda ganhava do inglês no quesito "estrangeirismos pedantes que caem bem na boca dos babacas e dos publicitários", continha 14 garçonnières. Em suma, sempre foi o que em bom português se chama um pardieiro de putas e estudantes. Ou seja, um treme-treme.
Tinha um gorducho que morava no segundo andar. Costumava cruzar com ele no Pão de Açúcar da Consolação. Era viciado em refrigerante. Pelo menos três garrafas de Coca-Cola no carrinho, daquelas PET 2,5 L. Máquina de processar glicose. Apelidei-o de Quindim num dia de inspiração poética. Mas nunca cheguei a estabelecer contato direto com ele. Nem bom dia nem boa noite. Nada. Não sei bem porque... Quer dizer, sei sim... Deixo de lado a hipocrisia.
A verdade é que sentia pena do Quindim. Primeiro porque ele era gigante, lento e desajeitado como uma carreta e, segundo, porque tinha cara de bunda. Impossível não se compadecer com a sua expressão lânguida, tão característica de gente obesa, de sofrimento agudo em dia de sol. Os olhos esbugalhados lhe davam o ar frágil dos meninos que apanham na escola. O próprio Bozo do Nascido pra Matar (Full Metal Jacket, em inglês – aliás, que tradução de merda é essa?).
De certa forma, contudo, me identificava com ele. Como se o Quindim fosse a versão esculhambada de mim. Como eu, morava sozinho na artéria da cidade e sofria com isso. A solidão às vezes pega pra capar. Mas, ao contrário de mim, não conseguia boceta. Nenhuma. Nunca. Varava as noites esfolando o papagaio na internet, depressivo e alcoólatra de refri. Ao passo que eu estava num regime de sexo pelo menos três vezes por semana. Com garotas diferentes. Calhorda em grande estilo.
Até que descobri que o Quindim não só era bicha como masoquista. Queria morrer de pena. Imaginar aquele gorducho com cara de pétala sendo currado por trás e tomando palmada nas ancas me consumia de tristeza. Quem me disse foi o zelador do prédio. “Não agüento mais esse viado gemendo no meio da noite que nem boi no cio. Você precisa ver as coisas que ele fala pros nego dele. Um dia ainda subo lá e encho de porrada”. Devia mesmo ser o inferno morar debaixo de uma bicha masoquista de 120 quilos. Em especial, porque não tinha como reclamar. Se um dia ele cumprisse a promessa de fato e batesse na porta do Quindim com a intenção de arrebenta-lo, provavelmente seria convidado a passar o resto da semana na função de troglodita. O pesadelo em dobro.
Anos depois, me enfiei num cine 24 horas da rua Vitória. Estava realizando uma pesquisa pra uma oficina teatral com o pessoal do Vertigem. O tema era perversão sexual. Fomos eu, o Valdir Grillo e uma outra atriz cujo nome não lembro.
Passeando pelas tétricas salas do cinema – tratava-se de um complexo de quatro andares escuros e escorregadios, dos quais o terceiro era a sala de projeção –, me deparo com uma imensa massa amorfa chacoalhando num canto. O lugar é bizarro e oleoso; lembra o Rectum do Irreversível – gente trepando pra todo lado, pica a dar com pau. O terremoto humano, ia dizendo, me chamou a atenção como um deja vu. Observei com mais cuidado. Pasmei. Não deu outra: era o Quindim. De quatro, tomando palmada nas ancas e gemendo que nem boi no cio.
Nunca tinha visto dois caras trepando ao vivo nem nunca tinha visto ninguém trepando naquela intensidade furiosa. Os tapas reverberavam no ar como estalos de chicote. Curioso que não senti pena do Quindim. Ele tirava um prazer sincero daquela surra. Gemia era de júbilo e tesão, não de dor.
Enfim, foi dessa situação grotesca, mas ao mesmo tempo sublime, que tirei a inspiração para elaborar minha cena pra oficina e agora pra inaugurar essa página dedicada ao grotesco.
A primeira entrada a gente nunca esquece.
Tinha um gorducho que morava no segundo andar. Costumava cruzar com ele no Pão de Açúcar da Consolação. Era viciado em refrigerante. Pelo menos três garrafas de Coca-Cola no carrinho, daquelas PET 2,5 L. Máquina de processar glicose. Apelidei-o de Quindim num dia de inspiração poética. Mas nunca cheguei a estabelecer contato direto com ele. Nem bom dia nem boa noite. Nada. Não sei bem porque... Quer dizer, sei sim... Deixo de lado a hipocrisia.
A verdade é que sentia pena do Quindim. Primeiro porque ele era gigante, lento e desajeitado como uma carreta e, segundo, porque tinha cara de bunda. Impossível não se compadecer com a sua expressão lânguida, tão característica de gente obesa, de sofrimento agudo em dia de sol. Os olhos esbugalhados lhe davam o ar frágil dos meninos que apanham na escola. O próprio Bozo do Nascido pra Matar (Full Metal Jacket, em inglês – aliás, que tradução de merda é essa?).
De certa forma, contudo, me identificava com ele. Como se o Quindim fosse a versão esculhambada de mim. Como eu, morava sozinho na artéria da cidade e sofria com isso. A solidão às vezes pega pra capar. Mas, ao contrário de mim, não conseguia boceta. Nenhuma. Nunca. Varava as noites esfolando o papagaio na internet, depressivo e alcoólatra de refri. Ao passo que eu estava num regime de sexo pelo menos três vezes por semana. Com garotas diferentes. Calhorda em grande estilo.
Até que descobri que o Quindim não só era bicha como masoquista. Queria morrer de pena. Imaginar aquele gorducho com cara de pétala sendo currado por trás e tomando palmada nas ancas me consumia de tristeza. Quem me disse foi o zelador do prédio. “Não agüento mais esse viado gemendo no meio da noite que nem boi no cio. Você precisa ver as coisas que ele fala pros nego dele. Um dia ainda subo lá e encho de porrada”. Devia mesmo ser o inferno morar debaixo de uma bicha masoquista de 120 quilos. Em especial, porque não tinha como reclamar. Se um dia ele cumprisse a promessa de fato e batesse na porta do Quindim com a intenção de arrebenta-lo, provavelmente seria convidado a passar o resto da semana na função de troglodita. O pesadelo em dobro.
Anos depois, me enfiei num cine 24 horas da rua Vitória. Estava realizando uma pesquisa pra uma oficina teatral com o pessoal do Vertigem. O tema era perversão sexual. Fomos eu, o Valdir Grillo e uma outra atriz cujo nome não lembro.
Passeando pelas tétricas salas do cinema – tratava-se de um complexo de quatro andares escuros e escorregadios, dos quais o terceiro era a sala de projeção –, me deparo com uma imensa massa amorfa chacoalhando num canto. O lugar é bizarro e oleoso; lembra o Rectum do Irreversível – gente trepando pra todo lado, pica a dar com pau. O terremoto humano, ia dizendo, me chamou a atenção como um deja vu. Observei com mais cuidado. Pasmei. Não deu outra: era o Quindim. De quatro, tomando palmada nas ancas e gemendo que nem boi no cio.
Nunca tinha visto dois caras trepando ao vivo nem nunca tinha visto ninguém trepando naquela intensidade furiosa. Os tapas reverberavam no ar como estalos de chicote. Curioso que não senti pena do Quindim. Ele tirava um prazer sincero daquela surra. Gemia era de júbilo e tesão, não de dor.
Enfim, foi dessa situação grotesca, mas ao mesmo tempo sublime, que tirei a inspiração para elaborar minha cena pra oficina e agora pra inaugurar essa página dedicada ao grotesco.
A primeira entrada a gente nunca esquece.